jueves, 24 de noviembre de 2011

Relato de uma agressão no Chile

Queria relatar que, ontem à tarde, fui ao evento organizado pela Prefeitura de Providencia, na capital do Chile, em homenagem ao brigadeiro Miguel Krassnoff, condenado a 148 anos de prisão por violações aos direitos humanos. Sou jornalista, vivo no Chile desde 2006 e trabalho como free lancer. Colaboro eventualmente com o portal Opera Mundi, a revista Fórum e o Diário Liberdade. Este dia, estava cobrindo o evento para o Diário Liberdade.


Durante a cobertura, quando tentava tirar fotos de alguns dos primeiros confrontos entre policiais e manifestantes ligados a grupos de defesa dos direitos humanos, que foram ao local protestar contra a homenagem, um policial do batalhão de forças especiais dos Carabineros (polícia militarizada chilena) arrancou a câmera da minha mão de forma brusca (eu a levava na mão esquerda, enlaçada ao pulso, mas a ação foi rápida, quando me dei conta ele já a tinha em seu poder) e passou a perguntar minha identidade, o que eu estava fazendo no local, porque estava tirando fotos e que tipo de fotos estava tirando. Colaborei respondendo as perguntas de forma pacífica e sem questionar, apesar dele insistir com as perguntas, ainda quando eu já as tinha respondido, e de forma agressiva e intimidatória, apesar de ter me identificado conforme o que me foi solicitado, sem faltar ao respeito e sem questionar as ordens policiais e os limites de ação jornalística estabelecidos desde o começo do evento - desde o começo eu permaneci atrás do cordão policial que separava a entrada dos convidados e a imprensa autorizada dos demais jornalistas e dos manifestantes, apesar de que foi nessa área, supostamente autorizada para minha permanência, que fui abordado pelo policial que me tirou a câmera das mãos. Cabe destacar aqui que apenas alguns poucos meios estavam autorizados pelos organizadores a cobrir a homenagem, e eu desconheço os critérios estabelecidos para tanto, já que algumas equipes de televisão e meios importantes do paìs tampouco puderam ter acesso.

Posteriormente, pedi ao policial (cujo nome não fui capaz de identificar, ou pelo menos não havia identificação visível na farda que usava) que me devolvesse a câmera, mas de forma educada, explicando que precisava dela para realizar o meu trabalho, assim como entendia que a polícia também estava fazendo o trabalho dela. Porém, antes de eu terminar minha explicação, o oficial atirou minha câmera ao chão. Antes disso, apagou as fotos que eu já tinha tomado até aquele momento, e retirou as pilhas da câmera (que não me foram devolvidas). Dessa forma, não pude mais colher material gráfico a respeito do evento.

Infelizmente, não fui o único jornalista que sofreu com a ação policial na jornada de ontem, e o mais lamentável é que a agressão a mim foi mais direcionada ao meu trabalho. Apesar da intimidação e do que fez à minha câmera, o policial jamais me golpeou ou insinuou alguma agressão física, mas não posso dizer o mesmo de alguns dos meus colegas. No final da jornada de ontem, um colega da Rádio ADN, Esteban Suárez, que tentou interceder por outro jornalista de meios gráficos quando esse estava sendo detido, foi agredido dentro de um furgão policial (http://twitter.com/#!/esteban_sanchez/status/138792266272743424 e sanchez/status/138796763871055872).

Em outros eventos ocorridos durante o conturbado ano que vivemos no Chile, abusos policiais ao trabalho jornalístico foram registrados, sobretudo durante as marchas do movimento estudantil. Desde o início da gestão de Piñera, em março de 2010, vinte jornalistas registraram acusações formais contra a polícia chilena por agressões durante o exercício do trabalho de reportagem, doze deles ligados a meios estrangeiros, os demais oito de meios locais, a maioria deles eram fotógrafos, como Hector Retamal (http://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=S2ziGU0NGMQ) e Fernando Fiedler (http://www.youtube.com/watch?v=UP65yN6Ei98&feature=related).

Ontem foi a primeira vez em que isso me afetou pessoalmente, apesar de não ter passado a maiores agressões, como as sofridas pelos relatos linkados acima, ou o que aconteceu ao fotógrafo Victor Salas, que perdeu um olho devido às agressões sofridas, conforme registrado em matéria publicada por João Paulo Charleaux no Opera Mundi.

Agradeço aos que puderem divulgar o que aconteceu e denunciar os graves abusos ao trabalho jornalístico que temos sofrido.

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